Belém, escolhida para sediar a COP30, enfrenta uma crise silenciosa que ameaça a própria essência da conferência climática: a explosão dos preços de hospedagem. A cidade, com sua força simbólica sobre a Amazônia, viu-se sobrecarregada por uma demanda que supera em muito sua capacidade hoteleira, elevando os valores a patamares inacreditáveis e afastando importantes participantes do evento.
A oferta limitada de leitos em Belém – estimada em cerca de 18 mil – não acompanha o volume de visitantes esperado, estimado entre 45 mil e 60 mil pessoas. Consequentemente, surgiram casos extremos de especulação: uma suíte que normalmente seria acessível foi anunciada por cifras exorbitantes, na casa de centenas de milhares de reais por noite. Em plataformas digitais, diárias chegaram a ultrapassar o teto de US$ 600 por quarto estipulado pela organização, com muitos anúncios obrigando estadias mínimas muito acima do período do evento. Essa escalada levou o setor hoteleiro local e o governo a buscar alternativas, como ampliação de leitos, uso de navios de cruzeiro, alojamentos em escolas, motéis adaptados e até contêineres reformados.
Com esse cenário, delegados de países em desenvolvimento indicaram dificuldades para participar integralmente da conferência, em especial aqueles com restrições orçamentárias estritas. Pressões internacionais emergiram, com chamados emergenciais da ONU para mitigar os custos e viabilizar hospedagem acessível. A saída encontrada incluiu a disponibilização de camas adicionais em diferentes formatos – inclusive navios – e a criação de um site oficial para atrair hospedagens com preços justos.
O governo federal e lideranças da conferência têm repetido que Belém permanece como sede sem plano B. Eles insistem na importância simbólica da Amazônia e na necessidade de tornar a conferência real, inclusiva e integrada à região que representa. Contudo, a persistência da disparidade nos preços ameaça tornar a COP30 menos plural, afastando vozes essenciais, como as de ativistas, pesquisadores, povos indígenas e representantes da sociedade civil, enfraquecendo a legitimidade do debate climático.
Além do impacto imediato na participação, essa crise de hospitalidade abre um antigo debate: é possível realizar um evento climático de alcance global num local iconicamente relevante, mas estruturalmente vulnerável? Ou será que a própria realização está sendo comprometida por uma infraestrutura que não acompanha a ambição do evento?
O dilema em Belém transcende questões logísticas. Ele questiona a capacidade do Brasil de transformar simbolismo ambiental em governança equilibrada, capaz de acolher quem constrói o diálogo climático – não apenas como expectador, mas como agente ativo. Se a COP30 quiser ser, de fato, uma conferência da Amazônia e não apenas sobre a Amazônia, ela precisa garantir que todos os interessados possam estar presentes – não silenciados pelos preços ou excluídos por obstáculos materiais.